Para quem seguiu os vários debates entre os sete candidatos actuais à Presidência da República, não será, infelizmente, difícil de entender porquê e porque chegámos já onde nos encontramos.
Porque chegámos já onde nos encontramos, é fácil de explicar, como já o fizemos e se encontra escrito, inclusive, num dos capítulos «Do Mar em Exaltação de Portugal», ou seja, pela activa promoção de uma crescente infantilização do discurso político realizada pelo actual Presidente da República, conferindo um primado à emoção e ao sentimento sobre o pensamento, não apenas desadequado mas, talvez mesmo, irremissivelmente perverso.
É o sábio despertar das emoções e dos sentimentos quanto melhor serve à condução das multidões?
Sem dúvida, mas totalmente inadequado para uma franca, séria e elucidativa discussão política, bastando três simples exemplos para ilustrar exactamente onde esse aparentemente inócuo mas, de facto, grave erro, de imediato conduz _ não sem também, como logo se verá igualmente, às mais sérias consequências.
Deve uma discussão política, que se quer séria, franca e busque ser realmente elucidativa, reflectir sobre os «meios» ou sobre os «fins»?
A política, toda a verdadeira política, respeita, evidentemente, a uma reflexão sobre «meios», não sobre «fins».
A quanto assistimos permanentemente, porém, é a todas as supostas discussões políticas resvalarem rapidamente para uma discussão sobre «fins», ou seja, para discussões de carácter eminentemente moral e não propriamente político _ como sempre foi, e é, muito próprio, de resto, de certas forças políticas.
Assim sendo, não surpreenderá já muito também que o actual Presidente da República tanto goste de se afirmar como o «Presidente de todos os Portugueses».
Será missão de um Presidente da República ser «Presidente de todos os Portugueses»?
É para isso que se elegemos um Presidente da República?
Evidentemente que não _ e só um povo muito infantilizado como nos encontramos já, aceita assim ser tratado.
O Presidente da República não é Presidente dos Portugueses, é tão simplesmente a figura ou personalidade que Preside à Res-pública, à Coisa-pública, ou seja, a figura ou personalidade que tem como missão zelar pela Coisa-pública, pelo que, sendo todos, um bem ou património comum, ninguém, individual ou em grupo, tem, por si só, capacidade de zelar ou teria sequer, eventualmente, sentido que o fizesse, particularizando, privatizando, o que é, por definição de todos.
E mais do que isso, de acordo com os preceitos da política moderna, da política liberal e democrática, os Portugueses devem-se ver, antes de mais de mais e acima de tudo como «Cidadãos», ou seja, como seres perfeitamente autónomos, independentes e livres, dotados de todos os direitos inerentes a quem é perfeitamente autónomo, independente e livre.
Aceitar intitular-se e afirmar-se o Presidente da República como «Presidente de todos os Portugueses», significa aceitar assumir-se como uma espécie de «supremo tutor» de todos os Portugueses que, na sua infantilidade, necessitam de quem tenha como missão prover ao seu bem-estar físico, material e, quem sabe, até espiritual.
Não são os Portugueses cidadãos suficientemente autónomos, independes e livres para dispensarem tal «tutoria»?
Diríamos que sim, ou gostaríamos de poder afirmar com plena convicção, que «sim», mas o facto é que toda essa confusão não deixa de conduzir igualmente a uma ainda mais grave confusão do que seja o papel, função e primordial missão de quem do transitoriamente eleito Presidente da República.
De acordo com o consignado na Constituição da República Portuguesa», «O Presidente da República representa a República Portuguesa, garante a independência nacional, a unidade do Estado e o regular funcionamento das instituições democráticas e é, por inerência, Comandante Supremo das Forças Armadas».
Independentemente da formulação mais ou menos feliz adoptada, o que importa reter, em síntese, é isto: cumpre ao Presidente da República, primordialmente, a afirmação e defesa de Portugal como Nação verdadeiramente Independente, Soberana e Livre, não deixando, por isso mesmo e por inerência, de assumir igualmente a responsabilidade enquanto Comandante Supremo das Forças Armadas.
Rememorando brevemente os recentes debates à eleição presidencial, foi isto que vimos ser discutido?
Não assistimos antes a longas dissertações como se os candidatos se propusessem a vir a ocupar o lugar de Chefes do Executivo, de uma forma ou outra, ao lugar de Primeiros-Ministros?
Sabemos como hoje, ultrapassada, em grande medida, uma fase mais militar da História, transformarem-se as guerras em guerras de carácter eminentemente económicas, assistimos a qualquer um dos candidatos a criticar o actual Presidente por ter permitido, por exemplo, não se dar prioridade absoluta à diminuição da colossal dívida que atrofia toda a nossa capacidade de desenvolvimento da nossa economia, assim como ter permitido a designada Lei das 35h, ainda por cima com o falso argumento de mesma não ir trazer custos e despesa acrescida, não deixando de ter, apesar disso, todas as consequências que são já bem patentes e conhecidas, assim como ter anuído à substituição de Joana Marques Vidal enquanto Procuradora-Geral da República, que estava a realizar um notável trabalho contra a terrível corrupção que tudo verdadeiramente corrói e destrói, não por razões de ordem «moral» mas porque, contribuindo tudo isso, em conjunto e em particular, para a nossa crescente incapacidade económica, o que está a colocar realmente em causa é a plena afirmação de Portugal enquanto Nação verdadeiramente Soberana, verdadeiramente Independente, verdadeiramente Livre, demonstrando, uma vez assumida como sua primordial preocupação a defesa de Portugal, qual o procedimento a seguir se eleitos?
E sendo o Mar, nesse mesmo enquadramento, o nosso último activo de decisivo valor Geopolítico e Geoestratégico, de incalculável valor económico, razão também pela qual, em grande parte, o decisivo valor Geopolítico e Geoestratégico, assim como de determinante valor identitário, como hoje se diz, ouviu-se alguém, do actual Presidente a qualquer um dos novos candidatos, discorrer minimamente sobre o assunto?
E nesse mesmo âmbito, sendo o Presidente da República por inerência Comandante Supremo das Forças Armadas, foi não ouvida uma única palavra que fosse sobre a organização, capacidade e meios da nossa Marinha para defender o Mar que é nosso, seja o Mar que temos já sob nossa jurisdição, seja o Mar que teremos por extensão dos limites da Plataforma Continental _ para já não falarmos nas questões de Direito que não deixarão de se colocar?
E não deixando de serem atribuídas especiais prerrogativas ao Presidente da República no que respeita à diplomacia, alguém referiu por uma única vez sequer a importância da nossa afirmação Atlântica e das eventuais questões que se podem colocar com uma eventual aproximação e abertura à China do Mar dos Açores?
A virtude de escrevermos para pessoas inteligentes é entenderem o que queremos dizer mesmo antes de o termos dito _ e mais, talvez, inútil continuarmos a discorrer.
Sim, possivelmente, já todos percebemos e não há nada de novo: permanecendo nesta passividade em que temos estado, persistindo neste plano cada vez mais inclinado em que temos vindo a cair, isto não vai mesmo acabar nada bem.